Impasses e conquistas de uma Igreja em construção

A celebração dos 115 anos da criação da Diocese de Ribeirão Preto é a oportuna ocasião para se pensar a história dessa Igreja particular, integrar-se nos seus acontecimentos do presente e, também, pôr em questão o seu futuro tendo vista a sua valiosa história. No decorrer de mais de um século, entre a intensidade do serviço e os êxitos que dele resultaram, foram vistos bispos e arcebispos governando – cada um a seu modo –, cidades em concentrações religiosas, unidade em prol das obras comuns, assembleias pastorais e diversos outros eventos históricos nos quais se remetia ao momento originário do bispado.

Concentração em frente à antiga igreja matriz de Ribeirão Preto, que se localizava na atual Praça XV. Foto: J. Passig

No princípio do século XX, a região de Ribeirão Preto se destacava pela produção cafeeira e pela grande quantidade de imigrantes, sobretudo italianos, que vinham ao interior paulista para o trabalho nas lavouras do solo avermelhado. Consequentemente, ideologias e religiões foram introduzidas entre as populações do território, de modo que a Igreja se preocupou em atender a essa demanda a fim de expandir a fé católica nesse espaço, que se cravava como uma promissora terra agrícola. O progresso começava a se evidenciar: estradas de ferro eram construídas e traziam o ideal de modernidade e a cultura secular.

Dom Duarte Leopoldo e Silva, bispo de São Paulo. Fonte: Cúria Regional Sant’Ana – Arquidiocese de São Paulo.

Com a dissolução do Império do Brasil alguns anos antes, o catolicismo havia deixado de ser a religião oficial do país, por isso a Igreja precisou se adaptar à nova ordem republicana. Dedicou-se, então, às práticas devocionais e ao incentivo às festividades religiosas e culturais que agregavam a sociedade do período. Devido à posição geográfica de Ribeirão Preto e ao seu crescimento urbano, aliados aos recursos financeiros que advinham do café, Dom Duarte Leopoldo e Silva, bispo de São Paulo, elegeu a cidade para sediar a diocese que seria criada.

Apesar dos aspectos positivos, faltavam à cidade elementos essenciais como matriz aparatada, residência para o bispo e patrimônio em espécie. No entanto, a proposta do bispo de São Paulo se firmou e os trabalhos em preparação à criação e à instalação do bispado começaram a ser realizados. Monsenhor Joaquim Antônio de Siqueira, vigário da então matriz de Ribeirão Preto, foi delegado para a tarefa de coordenar a comissão central para levantamento dos fundos para a formação da fábrica, isto é, o patrimônio cuja renda sustentaria a manutenção da diocese. Visitou a maioria das paróquias da região que comporiam a futura Igreja particular, todavia, viu algumas barreiras se apresentarem: os indícios de uma crise econômica, a ausência de apoio dos municípios e de suas elites e o boicote da cidade de Batatais, que pleiteava ser a cidade episcopal da diocese.

O jovem Dom Alberto, primeiro bispo diocesano. Fonte: Museu do Seminário Maria Imaculada (Brodowski)

Superando esses problemas, o trabalho de reconhecimento do território foi finalizado e os recursos reunidos. Assim, a circunscrição eclesiástica que seria criada estava inicialmente preparada. Pela bula “Dioecesium Nimiam Amplitudinem”, Pio X, em 7 de junho de 1908, desmembrou a Diocese de São Paulo criando cinco dioceses no interior do estado, incluindo a de Ribeirão Preto. Para governá-la, foi nomeado o paranaense Dom Alberto José Gonçalves, que até então era sacerdote do clero de Curitiba e exercia funções políticas, tendo participado de diversas legislaturas como deputado e senador.

É importante salientar o esforço de Dom Alberto na formação da diocese. Nainôra Freitas pondera que “o bispo teve vários desafios ao assumir a diocese do ponto de vista espiritual, para assegurar o papel da Igreja diante da sociedade moderna e laicizada, pois a demanda para organizar a diocese era grande” (2011, p. 73). Havia, também, a questão da formação patrimonial da Igreja de Ribeirão Preto: para a construção do palácio episcopal e finalização das obras da Catedral, Dom Alberto ofereceu seus próprios recursos.

A instalação do bispado, ocorrida em 28 de fevereiro de 1909, é um dos pontos centrais para se entender o desenvolvimento urbano da referida cidade. Escolas, associações e instituições surgiram com o respaldo da diocese e fomentaram a formação educacional, as obras assistencialistas, as ações caritativas, dentre outros feitos. Desse modo, a região que anteriormente era valorizada apenas por motivos materiais e para geração de riquezas passou a contar com o incentivo à instrução humana e cristã. A diocese se estruturou e esteve em consonância com o caminhar da Igreja, de modo que no ano do seu cinquentenário de criação Pio XII a elevou à sede metropolitana, tornando-a Arquidiocese de Ribeirão Preto.

Compreender como nasce a Igreja particular de Ribeirão Preto é pertinente sobretudo agora, momento no qual a história acentua a importância da presença católica na região que lhe era destinada. Apesar das adversidades que apareceram desde o projeto até a instalação, a diocese surgiu e ocupou um lugar de relevância na composição cultural e social do território diocesano, que à época ia desde “o rio Mogi até as barrancas do Rio Grande” (Nosso Comentário, Diário de Notícias, 01/06/1958). Nesse sentido, colocar o passado em evidência, de modo a entender os problemas de origem e os processos sociais e eclesiais que os superaram, corrobora para uma consciente ação no presente.

Bruno Paiva Meni
Arquivo Metropolitano “Dom Manuel da Silveira D’Elboux”

 

REFERÊNCIAS

ARQUIVO METROPOLITANO “Dom Manuel da Silveira D’Elboux”. Carta Pastoral de Dom Alberto José Gonçalves, 1938. Arquidiocese de Ribeirão Preto, Cúria Metropolitana, Caixa 1.

DIÁRIO DE NOTÍCIAS. Nosso Comentário. Ribeirão Preto, 1958.

FREITAS, Nainôra Maria B. Rivi Nigri: a criação da diocese na nova Eldorado. Ribeirão Preto, Fundação Instituto do Livro (Coleção Nossa História), 2011.

LAURIANO, Monsenhor Dr. João. Fundação e instalação do bispado de Ribeirão Preto. Cúria Metropolitana de Ribeirão Preto, 1975.

Veja também:

Na Missa do Crisma arcebispo destaca o desafio de vivermos a harmonia evangélica como caminho para a construção da unidade

A Catedral Metropolitana de São Sebastião, em Ribeirão Preto, acolheu na manhã da Quinta-feira Santa, 28 de março, às 9 horas, os padres, diáconos, seminaristas, candidatos da Escola Diaconal, fiéis da Arquidiocese de Ribeirão Preto para a concelebração eucarística da Missa Crismal, conhecida também como Missa da Unidade ou Missa dos Santos Óleos